Um dos objetivos da política pública de natalidade, que constam do programa do XXIII Governo Constitucional, passa por criar condições para que as famílias possam ter os filhos que desejam, permitindo-lhes desenvolver projetos de vida com maior qualidade e segurança, conciliando o trabalho e a vida familiar e pessoal.

vide Portaria no 198/2022 de 27 de julho

A Portaria no 198/2022 de 27 de julho regula a concretização da medida da gratuitidade das creches e creches familiares, integradas no sistema de cooperação, bem como das amas do Instituto da Segurança Social, I. P., conforme consagrado na Lei 2/2022. 

Mas, com o andar da gerigonça política, quem são as crianças que vão ter realmente acesso a uma vaga gratuita na creche, em Portugal?

  • Primeiro, dizia-se que as creches gratuitas eram para todas as crianças (Julho 2021)
  • Depois, percebemos que a gratuitidade era só para crianças nascidas após 1-9-2021 e que frequentassem o sector social (IPSS com vagas financiadas ou uma ama do Instituto da Segurança Social I.P. (Lei 2/2022 de Jan 2022))
  • Entretanto, concluiu-se que as vagas do sector social não chegam, nem para metade das crianças que precisam desta resposta social, e, já depois das inscrições feitas para o próximo ano letivo, criaram-se novos citérios de acesso a uma vaga gratuita em 27 de julho 2022:
    1. Garantir vaga a quem já frequentou a creche no ano anterior;
    2. Crianças com deficiência/incapacidade;
    3. Filhos de pais menores de idade, crianças em situação de acolhimento ou em casa de abrigo;
    4. Crianças com irmãos na mesma resposta social;
    5. Crianças do 1o e 2o escalão que residem na área de influência;
    6. Crianças do 1o e 2o escalão, cujos pais trabalhem na área de influência;
    7. Crianças de agregados familiares monoparentais ou famílias numerosas, que residem na área de influência;
    8. Crianças que residem na área de influência;
    9. Crianças de agregados familiares monoparentais ou famílias numerosas, cujos pais trabalhem na área de influência;
    10. Crianças cujos pais trabalhem na área de influência.

Afinal,

  1. as vagas já não são para todas as crianças “independentemente do contexto socioeconómico em que vivem”...
  2. nem promovem “uma plena integração e igualdade de acesso de oportunidades a todas as crianças” (vide Portaria no 198/2022)

 

Pergunta 1)

Como se vão aplicar estes novos critérios da gratuitidade depois das inscrições já feitas?

Cancelam-se as inscrições às crianças que não cumprem os critérios e devolve-se o dinheiro? Simplesmente não se cumpre os critérios para quem já estava inscrito?

Pergunta 2)

Se a primeira prioridade vai para crianças que frequentaram a creche no ano anterior (mesmo nascidas antes de 1-9-2021) e se há poucas vagas nas IPSS, quantas crianças dos critérios seguintes vão ter acesso a vagas gratuitas?

Pergunta 3)

Se as prioridades de admissão a vagas gratuitas vão depois para crianças com maiores vulnerabilidades sociais e económicas (o que se compreende), quantas crianças sem problemas sociais e de saúde vão ter acesso a uma vaga  gratuita?

Pergunta 4)

Como se pretende atenuar as diferenças sociais e alcançar a inclusão social com este afunilamento de critérios a uma vaga gratuita?

Pergunta 5)

Se os berçários podem acolher mais crianças do que a lotação permite nas IPSS (para proteger crianças em risco), que qualidade de resposta vai ser dada nestas condições de salas supranumerárias, a estas crianças?

Pergunta 6)

Nas condições propostas com esta portaria, como se cumpre o 11o princípio do Pilar Europeu dos Direitos Sociais que protagoniza “serviços de educação e acolhimento na primeira infância a preços comportáveis e de boa  qualidade”?

Pergunta 7)

As creches particulares têm menos qualidade do que as amas da Segurança Social?

Pergunta 8)

As creches particulares cobrem, em média, mais do que 460€ por criança (custo técnico de uma criança por mês no sector social)?

Pergunta 9)

Onde está o superior interesse da criança?